A criptomoeda é legal em Portugal?
O desenvolvimento tecnológico das blockchain e das criptomoedas frequentemente suscita dúvidas legais, incluindo a capacidade dos sistemas jurídicos estabelecidos de abordar os desafios apresentados por inovações tecnológicas. Autoridades reguladoras, tanto de instituições europeias quanto de estados membros, estão progressivamente se debruçando sobre as questões ligadas às criptomoedas. Enquanto alguns países acolheram completamente as criptomoedas, estabelecendo normativas para salvaguardar investidores e estimular inovações, outros adotaram uma postura mais reservada.
Em Portugal, até um passado recente, o governo adotou uma postura de baixa intervenção com relação às criptomoedas. Não existem proibições nem restrições específicas impostas ao comércio ou posse de criptomoedas, o que implica que as criptomoedas são permitidas no território português. Esta abordagem liberal transformou Portugal em um local atrativo para investidores, entusiastas e empresas do setor.
Legalmente, não há proibição contra criptomoedas em Portugal, permitindo-se a aquisição, posse e comercialização das mesmas. Assim, as criptomoedas são consideradas legais em Portugal, e o governo reconhece seu potencial como alternativa para pagamentos e investimentos.
Contudo, é importante notar que as criptomoedas não possuem status legal como moeda corrente e, portanto, não são reconhecidas como dinheiro oficial. Até 2022, Portugal não tinha implementado legislação específica que regulamentasse diretamente as criptomoedas.
Esta ausência de regulamentação específica fez de Portugal um ambiente propício para o desenvolvimento do setor de criptomoedas. Lisboa, em particular, emergiu como um importante hub de tecnologia blockchain e criptomoedas, com diversas exchanges e startups operando no país. Além disso, várias empresas portuguesas passaram a aceitar criptomoedas como forma de pagamento.
Portugal também demonstrou sua ambição de fomentar o crescimento econômico por meio das criptomoedas, como evidenciado pelo seu Plano de Ação para a Transição Digital 2020, que propôs a criação de “Zonas Francas” para experimentação de tecnologias inovadoras.
Entretanto, isso não significa uma total liberdade regulatória para as empresas de criptomoedas em Portugal. O governo estabeleceu normas para assegurar que a operação com criptomoedas cumpra os padrões internacionais de Prevenção à Lavagem de Dinheiro (AML) e de Combate ao Financiamento do Terrorismo (CFT).
É relevante destacar que o processo de registro de uma sociedade por quotas em Portugal pode ser concluído em duas semanas, mas o processo de licenciamento pode durar meses. Para operar, as empresas de criptomoedas devem obter uma licença completa do Banco de Portugal como prestadoras de serviços de ativos virtuais (VASP), sendo a aderência às normativas de AML e CFT fundamental para a aprovação do licenciamento.
Regulação das Criptomoedas em Portugal
A regulação do setor de criptomoedas em Portugal é caracterizada por um conjunto diversificado de leis e normativas. Na ausência de uma legislação nacional detalhada, as transações envolvendo criptomoedas ainda não são objeto de uma regulação direta. Contudo, existem normativas específicas voltadas para os ativos digitais, as quais estão alinhadas com as diretrizes regulatórias internacionais e da União Europeia.
As normas aplicáveis às criptomoedas em Portugal abrangem principalmente medidas de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. O Banco de Portugal, atuando como o banco central e autoridade supervisora das instituições financeiras e de pagamento, é responsável pela supervisão e regulação das exchanges de criptomoedas e dos provedores de serviços de carteiras digitais.
Essa supervisão inclui a garantia de aderência aos padrões de Prevenção ao Branqueamento de Capitais (AML) e de Combate ao Financiamento do Terrorismo (CFT). Isto é realizado por meio do estabelecimento e execução de critérios de registro e licenciamento para as entidades que operam dentro do ecossistema cripto, conforme estabelecido pela Diretiva da UE 2018/843, implementada na legislação portuguesa através do Aviso 3/2021.
Adicionalmente, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) desempenha um papel na regulação e supervisão dos mercados financeiros e na proteção dos investidores. No que diz respeito às criptomoedas, a autoridade da CMVM estende-se à supervisão da emissão e comercialização de ativos digitais que são considerados valores mobiliários, como os emitidos durante Ofertas Iniciais de Moedas (ICOs) e Ofertas de Tokens de Segurança (STOs).
As exchanges de criptomoedas e os provedores de serviços de carteiras são obrigados a seguir rigorosos requisitos de registro e licenciamento. Estas obrigações buscam assegurar a manutenção da transparência, segurança e conformidade com os regulamentos AML/CFT, incluindo a condução de due diligence de clientes, o monitoramento de transações e o reporte de atividades suspeitas às autoridades relevantes. Tais entidades devem, ainda, implementar medidas de segurança avançadas para proteger os dados e os ativos dos usuários.
Até um passado recente, a tributação das criptomoedas em Portugal não contava com um regime específico, seguindo apenas as orientações da Autoridade Tributária Portuguesa (PTA), que isentava as transações de compra e venda de criptomoedas do imposto sobre ganhos de capital e do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), baseando-se na premissa de que os ganhos de venda de criptomoedas geralmente não eram taxados.
Em 2022, o governo português anunciou mudanças nesta política, revogando a isenção de impostos para os ganhos obtidos com criptomoedas, sob o argumento de que estes não possuem curso legal. Em vez de criar um quadro regulatório abrangente, Portugal optou por introduzir normas fiscais mais estritas para as criptomoedas, visando alinhar sua legislação com a de outros países europeus.
É possível comprar criptomoeda em Portugal?
A questão sobre como adquirir Bitcoin ou outras criptomoedas em Portugal é comum entre muitos interessados. Apesar de haver uma regulação implícita e explícita sobre os fornecedores de criptomoedas e ativos digitais sob a égide da legislação nacional e da União Europeia, não se observam proibições diretas ao uso de criptomoedas. Diversas exchanges de criptomoedas estão presentes no território português, facilitando o acesso dos usuários a uma ampla gama de ativos digitais.
A legalidade da compra de criptomoedas é acompanhada pela necessidade de observar que tanto as exchanges nacionais quanto as internacionais que operam no país estão sob regulamentações específicas. Estas normativas visam assegurar uma operação segura e protegida para os investidores.
Importantes exchanges centralizadas (CEXs) marcam presença no mercado de criptomoedas português, sendo rigorosamente monitoradas pelos órgãos reguladores competentes. Assim, quem deseja adquirir criptomoedas em Portugal por meio de uma CEX deve estar ciente de que essas plataformas precisam cumprir com as regulamentações específicas de combate à lavagem de dinheiro (AML) e ao financiamento do terrorismo (CFT).
Além disso, é crucial destacar que os provedores de serviços relacionados a criptomoedas, incluindo carteiras digitais e processadores de pagamentos, devem seguir o marco legal pertinente em Portugal.
Para aqueles que buscam alternativas para a compra de criptomoedas fora das vias tradicionais, as exchanges descentralizadas (DEXs) e soluções oferecidas pelo ecossistema de finanças descentralizadas (DeFi) representam opções válidas. Estas alternativas podem proporcionar maior privacidade e custos reduzidos, embora possam atrair maior atenção regulatória devido ao risco de atividades ilícitas.
Quanto à mineração de criptomoedas, não existem impedimentos legais para essa atividade em Portugal. Contudo, é essencial considerar que a legislação fiscal portuguesa, especificamente a do Orçamento de Estado de 2023, introduziu novas regras tributárias aplicáveis tanto às empresas de mineração quanto aos indivíduos envolvidos na criação de criptomoedas.
Tributação de Criptomoedas em Portugal
A tributação sobre criptomoedas em Portugal é percebida como favorável, dada a ausência anterior de um regime fiscal específico para estes ativos. Esta falta de diretrizes claras propiciou um ambiente atraente para investidores em criptomoedas, resultante não de uma decisão regulatória deliberada, mas sim da falta de ação do Estado em estabelecer normas fiscais claras, criando assim, de facto, uma atmosfera acolhedora para o setor de criptomoedas.
No entanto, o Orçamento de Estado de 2023 preencheu esta lacuna, introduzindo um regime fiscal que, embora não exaustivo, especifica que os lucros obtidos na venda de criptomoedas são considerados ganhos de capital para fins de imposto sobre o rendimento das pessoas físicas. Notavelmente, foi estabelecida uma taxa de 28% sobre os lucros de capital de ativos digitais mantidos por menos de um ano, com a exceção de ativos mantidos por mais de 365 dias.
Segundo o orçamento de 2023, os rendimentos derivados de posições em ativos digitais mantidas por menos de um ano estão sujeitos a uma taxa de 28%, tratados como rendimento passivo de finanças descentralizadas (DeFi). Aplica-se uma taxa fixa ao balanço líquido entre ganhos e perdas de capital resultantes da venda desses ativos, excetuando-se os ativos mantidos por mais de um ano. Além disso, saldos negativos de um ano podem ser compensados nos cinco anos subsequentes, caso o contribuinte opte pela agregação. As comissões cobradas por intermediários em transações de criptomoedas também são sujeitas a uma taxa de 4%.
Embora a tecnologia blockchain que suporta as criptomoedas possibilite um certo anonimato, sua transparência permite rastreabilidade. Tanto indivíduos quanto empresas devem estar cientes das obrigações fiscais decorrentes da posse e transação desses ativos. Rendimentos oriundos da emissão, validação e mineração de criptomoedas são considerados tributáveis, enquadrados como rendimentos de atividade profissional ou empresarial. A taxa de imposto sobre ganhos com criptomoedas varia conforme a faixa de imposto de renda do indivíduo.
Atividades envolvendo criptoativos qualificam-se explicitamente como atividades profissionais ou empresariais, sujeitas à tributação como rendimento empresarial, caso o rendimento bruto empresarial do contribuinte no ano anterior não exceda 200.000 euros. Neste cenário, 15% do rendimento bruto de transações de criptoativos realizadas no âmbito de uma atividade empresarial são tributados segundo uma escala progressiva de impostos (14,5% a 53%), com a taxa efetiva de imposto não ultrapassando 8% das receitas brutas.
Adicionalmente, o regime de 2023 instituiu um imposto de saída de 28% para detentores de criptoativos que mudem de residência fiscal, a menos que se mudem para um Estado membro da União Europeia ou do Espaço Econômico Europeu, ou para um país com um acordo de troca de informações fiscais com Portugal.
As transações em criptomoedas permanecem isentas de IVA, e doações ou heranças de criptoativos não são tributadas quando provenientes de cônjuges ou descendentes diretos. Importante destacar, os tokens não fungíveis (NFTs) e a venda de criptoativos que se enquadrem como valores mobiliários estão expressamente excluídos deste regime fiscal.
Perspectivas para o Futuro das Criptomoedas em Portugal
Nos últimos anos, Portugal consolidou-se como um refúgio atrativo para o universo das criptomoedas. A iniciativa Golden Visa, oferecendo benefícios fiscais e um caminho para a cidadania, tem sido um imã para investidores e empreendedores internacionais. Além disso, Portugal tem fomentado um ecossistema favorável para startups de blockchain e criptomoedas, como demonstra a criação da plataforma blockchain Panorama pelo governo em 2019, visando estimular a cooperação no setor. Esta política tem atraído entusiastas das criptomoedas, entusiasmados com a possibilidade de efetuar pagamentos de contas, imóveis e impostos utilizando criptomoedas.
Importante mencionar, o país tem se movimentado na direção de adotar uma regulamentação fiscal mais rigorosa sobre as criptomoedas, buscando harmonizar-se com as leis vigentes em outros países europeus. Em 2022, o governo português reformulou a política fiscal anterior, introduzindo novas diretrizes para a tributação de ativos digitais, com o objetivo de eliminar ambiguidades e lacunas legislativas, promovendo um sistema tributário justo e eficiente.
Contudo, a supervisão regulatória atual e as novas regras fiscais apresentam um escopo limitado, não abrangendo de forma exaustiva todos os aspectos dos ativos digitais. As criptomoedas representam uma realidade complexa que transcende a mera tributação de ganhos de capital e a regulamentação de prestadores de serviços de ativos virtuais (VASP).
Embora existam diretrizes gerais estabelecidas em nível da União Europeia e supranacional que influenciam as políticas nacionais, estas não são suficientemente detalhadas para assegurar um campo de atuação equitativo para as criptomoedas em todos os Estados-Membros da UE.
Até a implementação da regulamentação dos Mercados de Criptoativos (MiCA), o panorama regulatório na UE permanece fragmentado, e Portugal não é exceção. O futuro das criptomoedas em Portugal estará, portanto, vinculado à capacidade de alinhar a regulamentação nacional e europeia com a inovação. Assim, Portugal tem o potencial de continuar sendo um território acolhedor para o setor de criptomoedas, oferecendo um ambiente propício à inovação e ao desenvolvimento no campo dos ativos digitais.
Conclusão
Portugal tem emergido como um cenário promissor e acolhedor para o ecossistema de criptomoedas, atraindo investidores, empreendedores e entusiastas de blockchain de todo o mundo. Com iniciativas como o programa Golden Visa e a implementação de plataformas de apoio à inovação em blockchain, o país destaca-se como um dos destinos europeus mais favoráveis às criptomoedas. A abordagem regulatória até recentemente tem sido caracterizada por uma falta de legislação específica, o que proporcionou um ambiente de relativa liberdade para o crescimento e desenvolvimento do setor.
No entanto, o avanço na direção de uma regulamentação fiscal mais estrita reflete o compromisso de Portugal em alinhar suas políticas com as normas internacionais e europeias, visando garantir um sistema tributário justo e eficaz para os ativos digitais. Essa mudança indica uma maturação do mercado e um esforço para integrar as criptomoedas de maneira responsável ao tecido econômico e regulatório do país.
Apesar dos desafios inerentes à regulação de uma tecnologia tão dinâmica e em rápida evolução, Portugal está se posicionando como um líder no equilíbrio entre inovação e regulamentação. O futuro das criptomoedas em Portugal parece promissor, com o país buscando encontrar o equilíbrio certo entre fomentar a inovação tecnológica e assegurar a transparência, a segurança e a justiça fiscais. À medida que o país avança para uma regulamentação mais abrangente e alinhada com o panorama europeu, espera-se que continue a ser um porto seguro para o desenvolvimento das criptomoedas, mantendo-se na vanguarda da adoção e integração dessas tecnologias disruptivas.